quarta-feira, 3 de junho de 2009

terça-feira, 2 de junho de 2009

Vermute com Amendoim

“Eu não busco as tentações, elas é que esbarram em mim lançam um sorriso convidativo, um olhar desafiador e fogem a passos lentos. Nunca pude resistir ao toc toc dos saltos, ao farfalhar das saias, à profusão de cores e de aromas! Hoje sei que errei, mas naquele momento foi como se um demônio me tomasse, vi minha razão tornar-se cada vez mais débil e esconder-se no canto mais distante do meu ser. Tu bem sabes como sou sonhador, como tenho dificuldades em manter-me em terra firme, tem algo a ver com meu signo, é o que sempre diz minha mãe, acredito!” Raul abaixou a cabeça e fixou os olhos no copo de vermute, desejou ter cianureto para despejar ali umas gotas: Oras bolas, cianureto?! O máximo que poderia arrumar naquela baiúca mal cheirosa era uma porção de chumbinho...e olhe lá! Reuniu todas as forças para levantar o rosto e encarar Maria Luisa em pé à sua frente, o esforço sobre-humano durou longos segundos mas mal encontrou os olhos dela e sentiu uma rajada de ar deslocado e o tabefe sonoro e ardido que tatuou cinco dedos em sua face. Com todos os sinos do mundo tocando em seus ouvidos ele mal escutava os impropérios que lhe eram dirigidos, ela arrancou a aliança de noivado e atirou sobre a mesa. A jóia quicou várias vezes e saiu rolando pelo chão imundo do boteco enquanto Maria Luisa ia embora apressada com seu andar peculiar de exagerados requebros e a saia farfalhando alto, tão alto que ele mal podia ouvir os próprios pensamentos. Refeito da agressão ele engoliu a última dose da bebida, ajoelhou-se no chão tateando em busca da aliança. Encontrou-a a pouca distância de suas mãos e esticou-se para pega-la, neste momento o garçom que passava distraído a chutou e ela rolou em direção a um jukebox no canto do bar. “Infernoooo!”, rastejou para perto da máquina e olhou embaixo. Lá estava o símbolo do seu amor dividindo o lugar com baratas mortas, teias de aranhas e bitucas de cigarro. Tentou alcançá-la novamente, a mão não cabia no pequeno espaço e ela continuou ali, inacessível. “Maldição, mil vezes maldição. E agora Deus? Não tens mais nenhuma idéia para tornar meu dia pior?”, ele praguejava e chorava. Neste momento toda fauna do bar já estava atenta à patética cena rodriguiana quando ele ouviu uma voz que veio de cima. “Oi camarada, precisa de ajuda?” Raul olhou em direção à voz com certa apreensão e ali, parados, estavam um violeiro vestido de mariachi e um cara ruivo e extremamente branco metido numa estúpida fantasia de amendoim. Este último sorriu e estendeu a mão. “Venha camarada, vamos te pagar uma bebida!” Ele torceu o nariz, desconfiado. “Quem são vocês? Uma espécie nova de viados aliciadores? Deixem-me em paz!” O amendoim se irritou e olhou para o amigo. “Ta vendo Afonso, o mundo tá mesmo perdido! Se a gente tivesse dado bicuda neste morfético ele seria mais gentil. Meu amigo levanta daí ta parecendo pano de chão, o que ta pegando?” Raul desistiu de argumentar e em poucas palavras explicou o ocorrido para a estranha dupla. O mariachi tirou uma caneta do bolsinho do colete e entregou a ele que usou para alcançar a aliança. Ele apertou-a no punho e sorriu. “Agora levanta que vamos te pagar aquela dose”, disse sorrindo o amendoim que agora reparando melhor era albino. “Tudo bem, estou duro mesmo!”, ele levantou-se e acompanhou-os até o balcão.
Sentaram nos banquinhos amarelos e altos, o mariachi pediu um cachaça, o amendoim uma vodka e Raul mais um vermute, o amendoim falava pelos cotovelos e o mariachi apenas concordava com ahans e uhuns, vez ou outra soltava um é verdade! Eram divulgadores de uma marca de amendoins e castanhas que vinham em saquinhos compridos e com a foto de uma lhama. “O que tem a ver lhamas com amendoins?” “Não é uma lhama é uma vicunha.” Saiu em defesa o moço ruivo que se chamava Leon. “ Na verdade não é Leon, é Luis mas prefiro que me chamem assim!” E continuou a explicação. “O presidente da empresa plantava amendoins no Peru, mas teve que fugir do país por causa do regime de Velasco, chegou aqui e descobriu que a mistura de amendoim salgado com cerveja agradava à população, então montou um império. Sofria de satiríase e morreu de gonorréia ano passado, agora os herdeiros estão brigando pela fortuna. A ganância e a pervesão ainda vão dizimar a humanidade!” “É verdade!”, refletiu o mariachi. Neste momento, alguém colocou uma canção no Jukebox e um travesti de longos cabelos loiros começou a dançar, os três continuaram a beber e Raul guardou a aliança na carteira. “ Por onde andará Maria Luisa?” (Continua...não sei quando!)